domingo, 20 de abril de 2008

Blogar pode matar?

"Domingo, 20 de abril de 2008, 13h30

Blogueiros profissionais trabalham até a exaustão


Marilynn K. Yee/The New York Times

Usar a casa como escritório, na economia da Internet, pode gerar grande estresse físico e emocional


Eles trabalham longas horas, freqüentemente até a exaustão. Muitos deles são pagos por peça - não para fazer roupas, mas para escrever posts. Estamos falando daquele local em que a mão-de-obra é explorada na era da Internet. Vocês talvez o conheçam por outro nome: casa.

Uma força crescente de trabalhadores, blogueiros e empresários que usam suas casas como escritórios, armados de computadores e celulares inteligentes, conectados até a raiz dos cabelos, labutam sob grande estresse físico e emocional, criado pela economia da Internet que funciona 24 horas por dia e exige uma corrente ininterrupta de notícias e comentários.

É claro que os blogueiros poderiam trabalhar em outro lugar, e eles professam amor pela ação ininterrupta e pela possível oportunidade de criar um veículo mundial de mídia sem grande investimento financeiro. Ao mesmo tempo, alguns começam a se perguntar se alguma coisa saiu muito errado no conceito. Nos últimos meses, dois dentre eles morreram subitamente.

No mês passado, em Forth Lauderdale, Flórida, foi realizado o sepultamento de Russell Shaw, um blogueiro prolífico que tratava de assuntos tecnológicos e morreu aos 60 anos de ataque cardíaco. Em dezembro, outro blogueiro especializado em tecnologia, Marc Orchant, morreu de enfarte coronário fulminante aos 50 anos. Um terceiro, Om Malik, 41, sobreviveu a um ataque cardíaco em dezembro.

Outros blogueiros se queixam de ganho ou perda de peso, distúrbios do sono, exaustão e outros males nascidos do desgaste constante de produzir para um ciclo de informação e notícias que nunca pára, como o da Internet.

É certo que não existe um diagnóstico oficial de "morreu de blog", e a morte prematura de duas pessoas obviamente não se qualifica como epidemia. E tampouco se pode ter certeza de que o estresse profissional contribuiu para essas duas mortes. Mas amigos e familiares das vítimas, e colegas que trabalham em sistema semelhante, dizem que as mortes os fizeram pensar sobre o perigo do estilo de trabalho que adotaram.

A pressão atinge até mesmo aqueles que trabalham por conta própria ¿e são bem remunerados por isso.

"Não morri ainda", disse Michael Arrington, fundador e co-editor do TechCrunch, um popular blog de tecnologia. O site gerou milhões de dólares em receita publicitária, mas o custo foi ponderável: Arrington diz que ganhou mais de 13 quilos nos últimos três anos, sofre de distúrbios graves do sono e transformou sua casa em escritório para ele e outros quatro funcionários. "Em determinado momento, terei um colapso nervoso e serei internado em um hospital, ou algo assim vai acontecer".

"Esse ritmo não é sustentável", disse.

Não se sabe quanta gente escreve blogs remunerados, mas o número certamente atinge a casa dos milhares ou talvez dezenas de milhares.

O surgimento dessa categoria de trabalhador da informação segue em paralelo com o desenvolvimento da economia online. Porque a Internet se tornou uma importante mídia editorial, a publicidade agora se transferiu para a rede com toda a força.

Mesmo em empresas estabelecidas, a Internet mudou a natureza do trabalho, permitindo que as pessoas instalem escritórios virtuais e trabalhem de qualquer lugar, a qualquer hora. A flexibilidade tem um lado negativo, já que os trabalhadores estão sempre a um clique de distância dos encargos profissionais. Para os obsessivos trabalhadores do setor de informação, isso pode querer dizer não sair de casa jamais.

Existe uma crescente legião de cronistas online, reportando e refletindo sobre esporte, política, negócios, celebridades e todos os nichos concebíveis. Alguns escrevem por diversão, mas milhares o fazem para empresas - como funcionários ou prestadores de serviços -, ou criaram companhias próprias de mídia, com o objetivo de lucrar.

Uma das categorias mais competitivas é a de blogs sobre desenvolvimentos tecnológicos e notícias de tecnologia. Eles vivem em feroz e ininterrupta competição para divulgar notícias sobre empresas, apresentar produtos novos ou expor mancadas corporativas.

Ao vencedor, os benefícios de ego - e também, potencialmente, a publicidade. Os blogueiros que escrevem para esses sites muitas vezes recebem por post, ainda que alguns sejam pagos com base no número de leitores que atraem. Eles criam audiência furando a concorrência ou ao publicar imenso volume de informações - ou ambos.

Alguns sites, como os da Gawker Media, pagam salários base e bonificações aos blogueiros que atinjam metas, por exemplo 100 mil visitas mensais à página que redigem. Depois, a meta é elevada, como no caso de vendedores que faturem comissões: quanto mais textos, mais dinheiro.

Os blogueiros de alguns dos maiores sites dizem que os escritores podem ganhar US$ 30 mil (cerca de R$ 50 mil) ao ano, inicialmente, e que alguns deles atingem os US$ 70 mil (R$ 115 mil). Alguns dos mais incansáveis ultrapassam a marca de US$ 100 mil, e alguns empresários do setor criaram pequenos impérios na Internet que geram centenas de milhares de dólares ao mês. Outros escritores que estão tentando fazer carreira com blogs dizem que conseguem faturar apenas por volta de US$ 1 mil mensais (R$ 1,7 mil).

Velocidade pode ser essencial. Caso um blog seja superado por um milissegundo, o post de outra pessoa é que atrairá a audiência, os links e a maior porção das verbas publicitárias.

"Não há um momento sequer - nem mesmo durante o sono - em que a pessoa não esteja preocupada com a possibilidade de estar perdendo uma matéria", diz Arrington.

"Não seria ótimo se a gente adotasse uma regra que diz que nenhum blogueiro pode postar texto novo entre as 20h, hora do Pacífico, e o raiar do dia seguinte? Assim poderíamos todos descansar", disse Arrington. "Mas isso nunca vai acontecer".


Tradução: Paulo Migliacci ME


The New York Times
Site Terra: http://tecnologia.terra.com.br/interna/0,,OI2761325-EI4802,00-Sob+pressao+escritores+blogam+ate+cair.html


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Revista da Semana
Sociedade>> Saúde

"Atividade geraria alto nível de stress

Três conhecidos blogueiros de tecnologia dos EUA tiveram ataques do coração desde dezembro, e uma matéria no jornal americano sugere que o stress de blogar pode ser a causa. Cora Nucci, blogueira do Information Week, diz não ser tão prolífica quanto seus colegas que morreram - Russell Shaw, do ZDNet, e Marc Orchant, do blognation – mas que “a carga de blogar pode ser sentida por qualquer um, até por amadores”. É constante a urgência de expressar um pensamento original e postá-lo primeiro, diz ela. “Há dias em que nos sentimos quebrando pedras debaixo do sol quente. Postar pode dar a sensação de ficarmos suando vitoriosos sobre uma pequena pilha de emtulho”. O perigo resulta do alto nível de stress de se trabalhar 24 horas sem parar, e da leitura e escrita sedentárias. No mundo dos blogs “o tempo é tudo”, afirma a PC World. “Você tem de ser o primeiro a encontrar, analisar e postar as notícias”. O terceiro blogueiro citado pela New York Times, Om Malik, sobreviveu a um ataque do coração. Ele tem 41 anos. No momento, está em Miami, descansando – segundo contou em seu blog. "


http://revistadasemana.abril.com.br/conteudo/geral/conteudo_geral_275344.shtml

Um comentário:

Daiane Torres disse...

Não concordo! Pelo menos para mim, a prática de postar gera um certo "alívio". É onde posso jogar pra fora meus pensamentos, sentimentos e emoções. Como se fosse uma terapia. Uma atividade de reflexão sobre o mundo. Uma exposição de valores e idéias. Mostra nosso lado humano. Quando não postamos, "sugere" ou uma falta de tempo, de inspiração, ou vontade. Torna-se algo ruim, talvez, para aqueles que já estejam em desequilíbrio e confronto interno. Assim como o álcool, cigarro, drogas, internet, sexo, amor, para os viciados. Claro que na nota da revista, falam de pessoas que vivem disso, passam 24h em função. Mas daí que o motivo da morte fosse o blog? Sedentarismo temos diante da era digital, computador, máquinas, eletrônicos. Repensar nossas atitudes e cuidados seria mais inteligente que colocar a culpa em meios e objetos que estão aí para facilitar nossas vidas e não para tirá-las.